Contrariamente ao que aconteceu em 2018, a vindima deste ano aponta para um crescimento na quantidade de vinho produzido, bem como na qualidade. Contudo, o corte de 8 mil pipas no benefício deste ano tem gerado alguma contestação, em especial entre pequeno e médios produtores.

O clima mais ameno, a quase inexistência de doenças e os tratamentos preventivos que foram feitos ao longo deste ano resultaram num aumento da produção de vinho estimada na Região Demarcada do Douro (RDD), podendo chegar às 288 mil pipas, assim como um excelente estado sanitário das uvas o que antecipa vinhos de boa qualidade.

As previsões são da Associação de Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID), que aponta para uma produção “a rondar entre 263 e 288 mil pipas de vinhos”. A produção declarada no Douro, na última vindima, foi de 199 mil pipas de vinho.

“Relativamente à produção dos últimos cinco anos, o aumento é da ordem dos 23%”, avança a diretora-geral da ADVID, Rosa Amador, advertindo, no entanto, que o resultado da próxima vindima vai depender “das condições climáticas e fitossanitárias que se registarem até setembro”.

As previsões do potencial de colheita são efetuadas com base no chamado modelo pólen, recolhido na fase de floração da videira, entre abril e junho, nas três subregiões do Douro: Baixo Corgo, Cima Corgo e Douro Superior.

A diretora geral da ADVID diz ainda que, em relação à qualidade, “este vai ser um ano muito bom", já que "não houve problemas fitossanitários e as uvas estão muito sãs”.

“Este foi um ano que correu bem aos viticultores", constata a responsável". Não foi um ano de grande pressão das doenças.”

As reações que têm surgido na região são muitas, António Lencastre, presidente da Federação Renovação do Douro (FRD), atual responsável pela Casa do Douro, diz-se otimista mas não muito, isto porque, apesar do previsto aumento, a quantidade a ser produzida este ano deverá ainda ficar abaixo da média habitual na região.

“É ingrato, e mesmo falacioso, fazer comparações com o ano passado porque foi um ano péssimo. Se crescermos 20 ou 30% em relação ao ano passado ainda estamos a decrescer em relação a 2017.

Por muito bem que esta campanha corra eu não acredito que ela ultrapasse 2017 ou seja, um ano médio baixo. Estamos a caminhar numa aura de otimismo que é perigoso. É uma verdade que estamos melhores este ano mas também se gastou mais dinheiro, depois da experiência vivida no ano passado fizeram-se mais tratamentos.

Todas as projeções feitas aconteceram em cima da polonização, que aconteceu em maio, abril. Hoje já temos a contagem de uvas e esses números são mais baixos. Estou otimista mas não muito otimista porque será uma campanha parecida com 2017.

Com estas temperaturas mais amenas as graduações não irão de encontro às graduações de anos anteriores”.

Também os produtores, em especial os pequenos e médios têm seguido esta linha de pensamento, um otimismo cauteloso, até porque nos últimos anos as quebras têm sido avultadas o que poderá levar a comparações pouco rigorosas.

“É bastante melhor do que no ano passado mas pior do que há dois anos. O estado sanitário das uvas é excelente, não houve doenças praticamente nenhumas mas isso também é porque, depois de um ano tão mau como o ano passado, este ano fizemos mais tratamentos preventivos, há alguns pontos onde se notam alguns escaldões mas nada de especial, a previsão é que em teros qualitativos esta seja uma vindima muito boa”, afirma Filipe Brás, produtor-engarrafador de Peso da Régua.

“A nível de qualidade a expectativa é boa. Os controlos de maturação estão muito bons, temos um equilíbrio muito bom entre o Ph e a acidez total, não há registo de muitas doenças, apenas alguns sinais de oídio mas em parcelas muito pequenas o que não tem grande expressão. A nível de quantidades esta será uma vindima média, longe de ser uma vindima de excedentes o que é bom porque significa que estamos a sair de um ciclo de três anos negativos” diz-nos João Pissarra, professor universitário na área da enologia e consultor em diversas propriedades da região.

Contudo, aquilo que se supunha ser uma boa notícia para a região acabou por ser um dos fatores que levam os produtores a criticar a decisão do Conselho Interprofissional de cortar em 8 mil o número de pipas em benefício, cifrando este valor nas 108 mil pipas.

Corte no benefício

A 25 de julho deste ano, o Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, IP (IVDP), em reunião do Conselho Interprofissional emitiu o Comunicado Anual de Vindima para este ano onde se lê:

“Sem prejuízo do disposto no artigo 4º do Comunicado de Vindima da Região Demarcada do Douro aprovado pelo Regulamento nº 570/2017, de 23 de outubro, a produção de mosto na Região Demarcada do Douro é, para a vindima de 2019, de 108.000 pipas (550 litros)”, um corte de 8 mil pipas quando comparado com a campanha de 2018.

O benefício é a quantidade de mosto que cada viticultor pode destinar à produção de vinho do Porto e é uma das principais fontes de rendimento dos produtores durienses. Em dois anos, o benefício diminuiu em 10.000 pipas de vinho, passando de 118.000, em 2017, para as 108.000, em 2019.

Este corte anunciado tem sido muito criticado, em especial por pequenos e médios produtores que têm no benefício uma forte fonte de rendimento que lhes permite colmatar os gastos ao longo do ano e que cada vez são mais altos quer nos produtos para os tratamentos, nos combustíveis ou na mão de obra.

Em comunicado, a Associação da Lavoura Duriense (ALD), fala num corte “brutal”, conseguido “com a conivência da produção”, acusando a FRD de prejudicar os viticultores.

“O Conselho Interprofissional do IVDP reuniu para aprovar o Comunicado de Vindima para este ano e decidiu aprovar 108.000 pipas de vinho a ser beneficiado.

Assim, os Viticultores têm um brutal corte de 8.000 pipas. Este corte tem a conivência dos atuais representantes da Produção no interprofissional, que votaram ao lado do Comércio, quando o normal seria o voto contra.

Como não há almoços grátis, o Comércio impôs o que quis, ou seja, um corte de 8.000 pipas. A associação FRD abdica sistematicamente da defesa dos Viticultores. É desta forma que paga o apoio incondicional que lhe tem sido dado pela AEVP mas, concretamente neste caso, quem pagou foram os pequenos e médios Viticultores, com um corte no benefício de 8.000 pipas de vinho.

A ALD – Associação da Lavoura Duriense, em comunicado recente, alertou para o que se estava a preparar no conselho interprofissional do IVDP. A falta duma verdadeira representação da Produção neste órgão, dá origem a que a AEVP (representantes do Comércio) se “passeie ao seu bel-prazer” no conselho interprofissional e dite as leis que lhe convém.

Já os ditos representantes da Produção (a FRD) não passam duma representação fantoche que apenas favorece a posição do Comércio”, lê-se no comunicado.

Por sua vez, António Lencastre, em declarações ao nosso jornal afirma que estes valores são os possíveis tendo em conta a realidade do mercado, lamentando que o benefício continue a ser visto por muitos como um subsídio à produção.

“Eu acho que foi o número possível, no limite superior. O benefício tem de deixar de ser visto como um subsídio ao viticultor, tem de ser visto como algo que temos de estimar, no sentido de tomar conta, cuidar. Ao longo do tempo a região habituou-se a um debate inflamado em que havia pouca razão e muita emoção quando o contigenciamento deveria ter um propósito puramente económico. Ou seja, estamos a cuidar que o nosso futuro amanhã seja melhor e é essa análise que dificilmente vemos feita na praça pública.

Neste momento temos na mão do comércio uma campanha inteira. Se o comércio decidisse não vir à vindima um ano, teria vinho em casa suficiente para manter o seu negócio. A cada dia que passa, se não tivermos cuidado com o nosso futuro corremos o risco a que amanhã nos venham comprar a quantidade que quiserem, ao preço que quiserem, e é isso que temos de evitar. O resto é pura demagogia é um puro “bitaite de café”.

Há quem diga que a produção não tem nada a ver com o comércio mas, se o comércio não vende, fica com mais em casa e no ano seguinte compra menos, é uma pescadinha de rabo na boca.

O benefício serve para que o Vinho do Porto seja uma coisa rara, porque só assim é que vale dinheiro”.

Visão diferente do presidente da FRD têm os pequenos e médios produtores para quem o corte no benefício significa um corte nos rendimentos mas também um aumento nos excedentes de uva disponível para a produção de DOC’s Douro, o que poderá levar também a um abaixamento do valor pago por pipa para este tipo de vinho, uma dupla penalização para quem o produz.

“Esta questão do benefício tem que ser forçosamente repensada, ou seja, até acredito que os valores estejam ajustados mas acho que podia ter sido um pouco mais generoso chegando às 110, 111 mil  pipas ou mesmo mantendo os números do ano passado.

O problema é que estes valores também se devem ajustar à produção para quem este corte significa uma perda de rendimento. O que está a acontecer é que não estamos a remunerar bem a produção o que faz com que ela não fique o que leva a que deixem de existir os pequenos lavradores, e isso é um caso sério.

Normalmente já existe excedente para os vinhos DO Douro, o problema é que ao criarmos este excedente com o corte de benefício estamos a introduzir uma certa desvalorização que acentua a realidade que vivemos ao longo dos anos que é a uva ser vendida abaixo do preço de custo. Isto não é sustentável.

Para os transformadores esta vindima pode ser financeiramente positiva mas o pequeno produtor vai ter menos rendimento porque há menos benefício e este ano há mais oferta o que vai provocar uma diminuição do valor da uva”, afirma o consultor João Pissarra.

A mesma ideia defende Filipe Brás, contudo o produtor com vinhas em Poiares, Peso da Régua afirma que atualmente as uvas destinadas aos DOC’s já são pagas a um valor aceitável mas esse valor deve ser mantido sob pena da região ficar ao abandono.

“O benefício é uma grande fonte de rendimento para nós, não sei avaliar se este corte era necessário ou não mas a verdade é que ao preço a que se vende o Vinho do Porto cada vez há menos interesse em fabricá-lo, é mais aliciante vender DOC’s.

Quando vemos uma garrafa de Vinho do Porto, com todos os impostos que lhe são aplicados, a ser vendidos num supermercado a 3 euros, ficamos a pensar que produzir este vinho deixa de ter interesse. A nós este corte causa diferença  e acho estranho porque se este ano há mais uvas a lógica seria haver mais vinho do Porto, neste caso vão sobrar ainda mais uvas para DOC’s.

Acho que as uvas para DOC’s têm vindo a ser valorizadas, até porque quem precisa de comprar uvas não pode esmagar o fornecedor. Há um limite mínimo para as pessoas poderem granjear as uvas e neste momento isso acontece, se os preços baixarem para níveis de há alguns anos atrás, então aí o Douro ficará a monte.

As grandes empresas têm que ter a sensibilidade para comprar as uvas a um preço justo. Acho que é aquilo que se vê este ano no mercado, não há o esmagamento de preços até porque há ainda uma grande carência de vinhos DOC’s, que estão praticamente esgotados nas adegas. Para este negócio ser viável temos que vender a pipa da uva entre os 400 e os 500 euros”.

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