Após mais de 2 meses de confinamento e portas fechadas, muitas atividades económicas começam agora a retomar a sua vida normal, contudo a realidade mudou e as adaptações são muitas. O VivaDouro falou com diferentes agentes económicos e entidades para perceber o que muda nesta nova normalidade.
Um dos setores mais importantes para o Douro é, atualmente, o turismo. Só no ano passado terão passado pelo Douro mais de 1,5 milhões de turistas, um número que este ano não será certamente alcançado com as respetivas consequências que isso trará para a região.
Luís Pedro Martins, presidente da Entidade Regional de Turismo (TPNP), esteve pela primeira vez presente numa conferência desde o início da pandemia na cidade de Lamego onde se constatou que neste momento o Douro é um lugar seguro, ou seja, pode e deve-se visitar.
À margem do encontro, em declarações ao nosso jornal, o responsável do TPNP afirmou que “as expectativas nos últimos dias tornaram-se mais positivas, estive há muito pouco tempo aqui na região numa press trip que percorreu a Nacional 2 e já nos cruzamos com muitos operadores e empresários que finalmente já nos deram boas notícias, nomeadamente que estiveram durante dois meses a cancelar reservas e nos últimos dias têm já estado a fazer reservas, o que é perfeitamente natural considerando que hoje o turista vai procurar este tipo de destino.
As questões de saúde, privacidade e tranquilidade vão colocar o foco na baixa densidade, em territórios como o Douro. Eu acho que vai ser precisamente por aqui que vamos começar a recuperar.
[caption id="attachment_9953" align="alignleft" width="300"] Luís Pedro Martins - Presidente do TPNP[/caption]Estamos com boas expectativas mas é claro que depende de outros fatores como por exemplo a data de abertura das fronteiras, em especial nesta região, com Espanha”.
Para Luís Pedro Martins a região tem muito a ganhar, em especial pelo tipo de turismo que recebe e que vão ao encontro das atuais preocupações do visitante: espaços pequenos onde a garantia de segurança é quase total.
“Uma vantagem é o tipo de alojamento que as pessoas irão procurar que será certamente um alojamento mais horizontal e não tanto na vertical, como é o caso das grandes unidades de hotelaria. Embora nós queiramos dizer aos turistas que até nesses grande hotéis conseguimos encontrar a segurança necessária. Uma grande percentagem das unidades que estão a receber o selo “Clean & Safe” é da região do Porto e Norte, já são cerca de 3 mil.
O concelho que eu dou aos empresários, em especial do ramo da hotelaria é que procurem o selo “Clean & Safe”, mas que não se fiquem apenas por aí. Esse selo é importante, mas mais do que isso é a aplicação das regras que levam à atribuição desse selo, podendo ir até um pouco mais longe, por exemplo, podemos também ser proativos nessa matéria porque tudo o que seja dar tranquilidade aos turistas é positivo e obviamente permite que estejam mais descontraídos a usufruir da experiência que fazem no país”.
Para o TPNP a estratégia não passa apenas pela promoção da região extra fronteiras, com esta nova realidade abre-se um novo mercado, o interno, que, devido à sua proximidade geográfica normalmente é mais marginalizado.
“Neste momento contamos com os turistas nacionais e quando falo destes falo dos de fora da região, mas também dos da região do Porto e Norte, e há muitos que desconhecem o Douro e as potencialidades que tem esta região com as suas paisagens, a oferta de experiências, de gastronomia, de vinhos e de património. Eu tenho dito que, se de facto quiserem ter férias inesquecíveis não é preciso ir para muito longe, aqui conseguem-se encontrar locais com segurança, que é aquilo que todos queremos hoje, mesmo para as famílias podendo mostrar aos mais novos as potencialidades da nossa região”.
Anfitrião do encontro, Ângelo Moura, autarca lamecense, acredita que a região tem tudo para retomar a sua atividade em força, fazendo desta adversidade uma oportunidade, fundada naquilo que nenhuma outra região tem para oferecer: os seus produtos e a resiliência das suas gentes.
“As expectativas são muitas, em qualquer período de crise surgem sempre oportunidades. Eu penso que para o Douro esta poderá ser uma oportunidade definitiva, temos tudo para vencer do ponto de vista económico.
[caption id="attachment_9951" align="alignright" width="300"] Ângelo Moura - Presidente da CM Lamego[/caption]Temos todos os atributos para ser um destino de excelência: a vinha, o vinho, a fruticultura, a cultura, a história, a monumentalidade e essencialmente a conjugação de todos estes fatores numa atividade enoturística com entidades e unidades de excelência. Temos que conseguir estabelecer uma rede que conjugue todas as entidades, privadas mas também as públicas, de forma a catapultar o Douro como destino de excelência que é.
Nenhuma outra região nos dá a segurança de evitar a propagação ou o contágio da Covid-19, o que pode levar a que as pessoas também procurem destinos mais próximos. Muitas vezes procuramos ir para o exterior perdendo a noção do que está mesmo ao nosso lado e esta pode ser uma oportunidade de mudar isso”.
Para o autarca, a situação difícil em que algumas empresas se viram afundar neste período pode ser uma oportunidade para se reinventarem, acima de tudo pela confiança que podem transmitir ao visitante.
“Estamos de facto numa situação muito difícil paras as micro, pequenas e médias empresas, e até mesmo para as grandes. Estes 2 meses de confinamento obviamente redundam num prejuízo enorme mas também aguçam o engenho e a arte para que sejam capazes de levar a uma maior afirmação da região. Estão criadas todas as condições para que o Douro seja considerado um destino seguro em termos de turismo por isso estou claramente esperançado nesta retoma. É necessário e fundamental que a região se mostre como um destino de confiança”.
Restauração expectante na retoma
A restauração foi uma das áreas em que o confinamento mais se fez sentir. A ausência de turistas e emigrantes, em especial durante o período da Páscoa, deixaram o setor abalado e a retoma vai sendo feita de forma lenta.
Em Armamar, José Correia é proprietário do Cantinho da Manuela, um restaurante familiar que celebrou o seu segundo aniversário em plena pandemia, um período que descreve como muito complicado, em especial devido à ausência dos emigrantes que costumam encher as ruas da vila na Páscoa.
[caption id="attachment_9956" align="alignleft" width="300"] José Correia e esposa - Restaurante O Cantinho da Manuela[/caption]“Foi uma fase muito complicada, em especial porque apanhou o período da Páscoa em que já estávamos a contar que seria boa para o negócio depois de um início de ano que já é mais parado normalmente.
Já tínhamos mercadoria comprada e tivemos que andar a ligar para os fornecedores para suspender ou mesmo cancelar as entregas”.
Para este empresário a retoma está a ser feita de uma forma lenta e ainda com muita desconfiança por parte dos poucos clientes que se vão sentando nas poucas mesas que agora a sala dispõe.
“Estamos a trabalhar a um terço da nossa capacidade. Recebemos poucos clientes para já e o que sentimos é que as pessoas ainda não têm muito à vontade, ainda sente algum receio, como se estivéssemos todos a desconfiar uns dos outros. O que esperamos é que agora o cliente comece a ter confiança em nós, em especial o cliente aqui de Armamar que já nos conhece”.
Ao VivaDouro José Correia destaca ainda o apoio da autarquia que, nesta fase de reabertura forneceu máscaras e gel desinfetante gratuitamente aos comerciantes.
“O município deu apoio com o fornecimento de máscaras e gel desinfetante, um apoio à medida do município, também temos que olhar para a nossa realidade, somos um município pequeno e o apoio foi dado à medida da nossa dimensão”.
Também na cidade de Peso da Régua a retoma na restauração começa a ser uma realidade. Localizado nos antigos armazéns da CP, o restaurante Castas e Pratos retomou já a sua atividade, motivado pelas reservas que começam a chegar depois de meses onde o telefone só tocava para cancelamentos.
“É um passo que será difícil até porque há ainda muita falta de turismo e o nosso espaço, em específico, é muito vocacionado para o turismo mas tínhamos que abrir e o telefone começou finalmente a tocar com reservas, ao contrário do que acontecia até agora em que só tocava para cancelar reservas.
Sabemos que será um regresso muito diferente daquilo que tínhamos perspetivado para este ano que seria um ano com uma subida acima dos dois dígitos”, afirma Manuel Osório, sócio-gerente do espaço.
O empresário conta à nossa reportagem que nesta reabertura serão tomadas todas as medidas de proteção e higiene, até porque afirma, “o cliente olha com mais desconfiança e vai olhar mais para a segurança do que propriamente para a comida ou para os vinhos, por exemplo, e essa vai ser a nossa aposta.
[caption id="attachment_9954" align="alignright" width="300"] Edgar Gouveira e Manuel Osório - Restaurante Castas e Pratos[/caption]Vamos ter implementadas uma série de medidas que vão desde as mais faladas como o frequente lavar das mãos, ou ainda mais frequente do que aquilo que já fazíamos, ao uso de máscara e o distanciamento das mesas, mas também o menu em QR Code, os tapetes de desinfeção, um medidor a laser de temperatura, etc.
Os nossos colaboradores vão realizar testes Covid e já lhes pedimos que tenham mais cuidado na sua vida social porque não queremos ser um foco de contágio, é uma situação que não é fácil mas todos eles estão conscientes disso e dispostos a colaborar connosco para que tudo corra pelo melhor”.
Manuel Osório afirma ainda que espera a “rápida retoma da atividade no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, porta de entrada de milhares de turistas na região do Douro, e na reabertura da fronteira terrestre com Espanha”, estes, conclui, “serão fatores fundamentais para o sucesso desta retoma”.
Reservas começam a chegar à hotelaria
Situada em Torre de Moncorvo a Casa Dona Maria Luiza é uma unidade de turismo rural situada com 12 quartos, onde o contacto com a natureza é uma constante.
Gonçalo Matos é o responsável por esta unidade que, apesar de fechada ao público geral continuou a laborar durante o período de pandemia.
“Nestes últimos três meses nunca tivemos efetivamente fechados porque temos alguns contratos com clientes que decidimos manter, como por exemplo com a CP para os seus funcionários ao abrigo da Estratégia Nacional para a Mobilidade, contudo para os restantes clientes estivemos encerrados.
[caption id="attachment_9952" align="alignleft" width="300"] Gonçalo Matos - Casa Dona Maria Luiza[/caption]A partir do dia 14 de março sentimos uma queda em cascata ao nível das reservas, apenas recebíamos cancelamentos.
O mês de abril foi muito estranho, o pessoal da CP que fica connosco já é nosso conhecido mas mesmo com eles notou-se uma grande diferença porque havia sempre alguma desconfiança e mesmo eles não se sentiam à vontade a circular ou estar ao pé de nós porque durante o dia acabavam por contactar com diversas pessoas no comboio”.
O cenário mudou a partir do momento em que o Governo decretou o fim do Estado de Emergência, conta-nos Gonçalo.
“A partir do momento em que as pessoas puderam começar a circular começamos a receber reservas. Logo no primeiro dia recebemos uma reserva de um grupo do Porto que vinham de barco mas acabamos por recusar por considerarmos que ainda não tínhamos reunidas todas as condições para os receber”.
Esta unidade hoteleira vê o seu trabalho dividido por dois tipos de clientes, “durante o inverno trabalhamos essencialmente com clientes nacionais, em especial pessoas que vêm para esta região em trabalho e pernoitam connosco, no resto do ano é que recebemos muitos estrangeiros, em especial turistas que vêm a Foz Côa ver as gravuras e acabam por vir dormir a Moncorvo.
Também há cerca de três anos foi criada a rota Portugal de Lés a Lés que é feita em troços off-road e é muito procurada por estrangeiros, como a nossa casa fica nesse trajeto hospedamos muitos turistas que a vêm percorrer, em especial austríacos, alemães e ingleses”.
O responsável por este turismo rural conta que “para esta retoma estamos a ter todos os cuidados, desde o uso de máscaras e luvas, a desinfeção de todas as áreas comuns e todo o tipo de superfícies em que as pessoas possam tocar.
As expectativas são altas até porque o que se sente é que as pessoas estão a tentar fugir aos grandes centros onde há sempre mais gente. Já temos também o selo “Safe & Clean” e aquilo que notamos quando agora recebemos algum contacto é que as pessoas perguntam logo se já o temos, dá-lhes uma maior sensação de segurança”.
Palácio do Gelo retoma atividade
Locais de habitual grande afluência, os centros comerciais foram dos últimos espaços a retomar a sua atividade normal. Na cidade de Viseu o Palácio do Gelo nunca chegou a estar totalmente fechado devido à existência de um hipermercado nas suas instalações, contudo, a restante atividade do centro comercial foi retomada na última fase de desconfinamento, que aconteceu a 1 de junho.
Cristina Lopes, diretora do espaço, conta à nossa reportagem que durante o período em que estiveram praticamente encerrados o tempo foi aproveitado para implementar as medidas de segurança impostas pela DGS para a reabertura.
“Nós nunca estivemos verdadeiramente encerrados porque, como se sabe, há lojas que por serem consideradas essenciais nunca encerraram, como é o caso do hipermercado que aqui temos.
[caption id="attachment_9957" align="alignright" width="300"] Cristina Lopes - Diretora do Palácio do Gelo[/caption]Ao longo deste período tivemos que nos ir adaptando de forma gradual às recomendações da DGS. Foi um processo gradual e mesmo antes da declaração do Estado de Emergência tínhamos adotado uma série de medidas, em especial relacionadas com a questão da limpeza e da higienização dos espaços, em especial com a colocação de dispensadores de álcool gel em diferentes pontos do nosso espaço.
Antes da reabertura a 1 de junho implementamos outras alterações, nomeadamente circuitos de circulação para as pessoas para permitir que não haja uma convergência de pessoas nos mesmos locais, sendo que já existe uma limitação no acesso de acordo com as normas estabelecidas para este tipo de espaços. Definimos também locais de entrada e saída no shopping evitando assim que as pessoas se cruzem nesse momento, colocamos infografia ao longo de todo o shopping alertando para os cuidados que as pessoas devem ter, nomeadamente a utilização de máscara que passou a ser obrigatória.
Por outro lado, ao nível da renovação de ar dentro do próprio centro as recomendações é que ela seja feita de forma regular, contudo nós estamos a fazê-la de forma permanente, ou seja, há injeção de ar novo a todo o momento. Isto tem um impacto significativo nos nossos consumos mas entendemos que é desta forma que conseguiremos assegurar a segurança de todos os nossos clientes.
Ao nível da área de restauração também foram implementadas uma série de medidas, como por exemplo a existência de apenas uma cadeira por mesa, fomentando assim o distanciamento social.
O shopping está pronto a receber todos, temos todas as medidas implementadas e fomos mais além daquilo que éramos obrigados”.
Cristina Lopes fala agora numa retoma gradual em que a adaptação terá de ser feita por todos, desde os lojistas aos clientes que se deslocam ao espaço comercial. Nos primeiros dias a afluência de clientes tem sido a esperada e a administração espera agora que, aos poucos, as pessoas possam ir ganhando confiança e regressando em maior número até porque o impacto económico foi grande num ano em que se esperava um forte crescimento.
“Este é um caminho que será percorrido de forma gradual por todos, houve um período de 2 meses e meio em que, excluindo o hipermercado, estivemos fechados e isso tem os seus impactos, quer para nós quer para cada um dos lojistas que compõe o nosso espaço até porque vivemos de pessoas e do consumo que elas fazem.
Gradualmente vamos regressando à normalidade e penso que assim continuará desde que os números da pandemia se mantenham estáveis a nível nacional, essa é a grande questão para que não haja um retrocesso de tudo isto.
Nos primeiros dias os números estão de acordo com aquilo que tínhamos previsto. O Início deste ano estava a ser ótimo e seria um ano de atingirmos novos objetivos, novas coisas. Efetivamente houve uma quebra mas continuamos a querer crescer e chegar aos nossos objetivos. Sabemos que será um ano difícil, que com tudo isto as pessoas ficaram afetadas e que irão levar algum tempo até regressarem aos seus hábitos normais de consumo, e mesmo esses hábitos irão mudar.
Estamos a regressar não à normalidade mas a uma "nova normalidade", sabemos disso, mas as pessoas não irão deixar de fazer compras por isso elas irão voltar ao shopping e vamos ter que nos ir adaptando ao longo do tempo.
A nossa preocupação foi dar segurança e confiança às pessoas e isto leva o seu tempo, não esperamos que a retoma aconteça de um momento para o outro, acreditamos, que de uma forma sustentada iremos atingir os nossos objetivos.