Chega o outono e pelas ruas, aqui e ali, o nosso olfato vai sentido o cheiro a castanha assada. Na região designada como DOP Soutos da Lapa, a Martaínha é a qualidade predominante, “a melhor de todas”, garantem. O VivaDouro foi perceber como está a colheita de castanha Martaínha.

No terreno a opinião é unânime, apesar de alguns contratempos, em termos de quantidade a expectativa é que esta colheita seja equivalente ao ano de 2019. Apesar de apresentar calibres mais pequenos há mais quantidade, o que equilibra a balança.
“A expectativa é que em termos de quantidade não seja muito inferior aquilo que se passou no ano passado, andará em linha com a campanha de 2019, talvez menos 5 ou 10%, nada muito significativo. Do ponto de vista da qualidade pode haver alguma diferença porque 2020 foi um ano muito seco e extremamente quente o que fez com que o crescimento das castanhas fosse muito afetado.
Este ano vamos ter, eventualmente, uma quantidade semelhante mas de calibres mais pequenos. Sendo de calibres mais pequenos conseguimos ter quantidades semelhantes porque tivemos um período de floração e polonização muito bom e há muita castanha. Portanto, quando pesarmos aquilo, o peso será semelhante ao do ano transato, esta é a expectativa que nós temos para este ano”, afirma José Laranjo, professor da UTAD, especialista na fileira da castanha.
A mesma ideia expressa José Ângelo Pinto, presidente da Cooperativa Agrícola de Penela (COOPENELA), que afirma que os produtores se têm mostrado satisfeitos com a colheita.
“Do ponto de vista da produção estamos com entregas superiores às do ano passado na mesma altura, o que quer dizer que a castanha está a cair mais cedo do que é habitual. A castanha está mais pequena, não tem para já os calibres muito grandes, normalmente esses ficam na árvore a desenvolver-se e portanto vêm mais tarde, mas está a correr muito bem.
Os agricultores estão contentes com as produções e estão a entregar a castanha com grande expectativa sobre a campanha deste ano. Não há anos iguais na fileira da castanha, a cada ano as condições variam e isso leva a que todas as campanhas sejam diferentes, estou desde 2012 muito ligado a este setor e nunca tive dois anos semelhantes sequer, cada um tem as suas características”.
José Fernando é um dos produtores da castanha Martaínha, no total tem 30 hectares de soutos onde produz em média 20 toneladas deste fruto. O produtor afirma que o clima não ajudou aos primeiros dias de colheita mas o regresso da chuva e do tempo mais fresco vão ser benéficos para o que falta da campanha.
“A castanha caiu mais cedo este ano mas agora as condições climatéricas também estão a ajudar com alguma chuva e o tempo mais fresco. O tempo seco não ajuda porque se torna mais difícil de abrir o ouriço o que faz com que as pessoas utilizem uns martelos para os abrir e acabam por danificar a castanha.
Com esta chuva as coisas mudam, obriga a que o ouriço abra e a castanha cai limpa no chão, o que é a situação ideal. O principal problema do castanheiro são as alterações climáticas e a presença de doença e pragas”.
Pragas e doenças que este ano se fizeram notar com mais intensidade na DOP Soutos da Lapa, em especial a Vespa da galha do castanheiro, como explica José Ângelo Pinto.
“A vespa das galhas do castanheiro de facto, pela primeira vez, atacou a nossa região com visibilidade muito alta, as galhas eram bastante visíveis e estavam bastante espalhadas ao contrário dos anos anteriores em que na variedade Martaínha, aquela que aqui é mais comercializada, não se notava o que nos levou a pensar que haveria alguma resistência à vespa.
Nas árvores atacadas o ouriço desenvolveu-se na mesma mas possivelmente não com a mesma quantidade, por exemplo, nós temos um castanheiro no quintal que foi fortemente atacado e no ouriço temos uma castanha boa e duas que não se desenvolveram. Eu acredito que seja de facto uma consequência da instalação da vespa das galhas do castanheiro na região.
Estamos a lutar seriamente contra esta doença através das largadas do bicho que come a vespa das galhas, o Torymus Sinensis, algo que está a acontecer de uma forma muito ativa. No caso particular de Penedono foram feitos dezenas de lançamentos, assim como na Mêda e outros concelhos aqui à volta. Estamos convencidos que irá começar a haver um equilíbrio entra as duas circunstâncias e não iremos sentir uma quebra de produção drástica como outros países sentiram, mas obviamente que sentiremos algo”.
Outro problema registado este ano é a existência de alguma podridão, afirma José Laranjo, que explica que o perigo desta doença é que dificilmente é identificada mas tem uma elevada taxa de contaminação entre os frutos.
“Temos alguma podridão que se começa a fazer notar e é terrível, essencialmente por dois fatores: porque por fora não se percebe que está podre por dentro e tem um índice de desenvolvimento muito grande, rapidamente pode alastrar-se a uma massa de castanhas se não forem mantidas nas condições ideais. É uma dor de cabeça mais que temos no setor e que estamos a trabalhar no sentido de ver qual a melhor solução para resolver”.
Apesar do mercado ter muita procura para a castanha Martaínha, José Ângelo Pinto tem ainda muitas dúvidas sobre como será o ano em termos de comercialização. Para o presidente da Coopenela, as limitações colocadas aos vendedores ambulantes de castanha assada pode causar alguns problemas.
“A parte que ainda não sabemos é a questão da comercialização porque precisávamos muito que os assadores de castanha fossem autorizados a trabalhar livremente, sem obstáculos criados através de medidas perfeitamente discricionárias que são um bom sintoma daquilo que acontece habitualmente nestas circunstâncias.
Os vendedores ambulantes de castanha estão a ser altamente descriminados, estão a ser proibidos em toda a Europa de exercer a sua atividade o que é uma absoluta imoralidade porque de facto um vendedor de castanhas não é um transmissor ativo de Covid ou qualquer outro vírus. Aliás, são pessoas que normalmente têm muito cuidado com a sua saúde e o seu bem estar e não serão focos de transmissão de doenças e estão a ser vistos como tal, situação que era necessário alterar urgentemente”.
No entender do professor José Laranjo, a fileira da castanha desempenha um papel importante na economia local e pode ser um travão à desertificação de concelhos como Penedono e Sernancelhe.
“Sernancelhe e Penedono são dois concelhos muito importante da região dos Soutos da Lapa, são cerca de mil hectares em cada concelho o que representa cerca de 1500 toneladas em cada um.
Esta é uma cultura que pode ajudar ao estancamento do despovoamento das populações, é um trabalho que tem que ser feito e aqui há também responsabilidade dos municípios que se debatem muitas vezes com falta de recursos humanos para manter estes recursos naturais. É uma cultura com muita rentabilidade, que se desenvolve nas condições apropriadas que existem no interior e isso é uma grande vantagem”.