Estimados Leitores,
Está na ordem do dia o regresso às aulas. E com o regresso às aulas começa o pesadelo ou o sonho de muitos profissionais dedicados e competentes. Muito competentes. A grande maioria dos professores dos ensinos básicos e secundário e dos educadores de infância são extraordinariamente competentes e se todos conhecemos um ou outro que não o é, esses são a exceção.
E são competentes apesar de todas as prendas com que a sociedade e os políticos em geral e os pais e encarregados de educação, em particular, lhes entregam. Porque têm de educar o mal-educado.
Têm de ensinar o que não quer ser ensinado. Têm de dar mais hipóteses a quem nada faz para as merecer. Têm de fazer a gestão de múltiplos aspetos burocráticos e administrativos que são de colocar qualquer burocrata de cabelos em pé. Têm de gerir as expectativas de pais e encarregados de educação que, muitas vezes, não percebem, ou não querem perceber as causas raiz, para os problemas dos seus educandos. E têm que fazer isto tudo de cara alegre e bem dispostos.
E a sociedade e os políticos em geral agradecem pouco o trabalho brutal que é feito na preparação das crianças e dos jovens para a vida. Congelam as carreiras durante muitos anos. Progressão salarial parada de 2005 a 2007 e de 2011 a 2017. O professor ganha brutos cerca de 1,600 euros em início de carreira e poderia terminar a ganhar cerca de 3,600 euros brutos, no modelo teórico da carreira efetiva, a que só os muito antigos tiveram acesso. Mas primeiro, para poder ter direito a progressão, precisa de passar de contratado para efetivo. Sendo contratado está sujeito a um concurso anual, podendo ter a sorte de ser colocado ao lado de casa ou o azar de ser colocado bem longe. Todos conhecemos casos de professores que trabalham já várias décadas e que ainda andam de escola em escola, de colegas em colegas, de alunos em alunos, ano após ano.
Uns anos a 20 kms de casa, outros a 100. Uns anos a conseguirem chegar a casa todos os dias, outros a serem obrigados a gastar o que não têm num minúsculo quarto para conseguirem dormir.
E sempre a ganharem pelo índice 167 da função pública (cerca de 1,600 Euros) ou pelo índice 188 (cerca de 1850 Euros), se tiverem horas de afetação mais elevadas, pois legalmente é como se tivessem começado agora.
Por isso em 2022 eram 55 mil candidaturas para 3,259 vagas de professor efetivo….
Mas, mesmo que o professor tenha conseguido vencer a questão da contratação e passar a ser efetivo, a seguir há o problema bem sério de ultrapassar as quotas dos escalões. Sim, para progredir na carreira é preciso que haja vagas, ou seja que as quotas estejam vazias e são muitos professores para poucas quotas o que faz com que um professor esteja efetivo, mas que não consiga progredir porque não há quotas disponíveis.
É, mais uma vez, o estado a ser incapaz de estabelecer regras para si próprio. É fácil para os governantes estabelecer regras para os privados, especialmente no que diz respeito à legislação laboral.
E depois obrigar os privados a aplicar a legislação. Por exemplo, num privado se um colaborador estiver mais do que 5 anos sem progressão de carreira, obrigatoriamente passa a ganhar um abono designado por diuturnidade. E no público, um professor que está no mesmo escalão há 20 anos, a saltar de escola em escola, de terra em terra e sempre a ser um profissional dedicado e competente o que lhe dá em troca a sociedade? Uma carreira congelada, uma incerteza permanente sobre o destino no próximo ano, a dificuldade de conciliar a família com a profissão e muitas outras coisas boas.
Felizmente há os sindicatos que, no caso dos professores até são bastante interventivos. Ou talvez não, pois os sindicatos estão praticamente nas mãos dos que passaram as quotas. Há muitos, muitos anos. E que, por isso, não têm estes problemas. E por isso lutam todos os dias, mas por outras causas, porventura mais próximas. Porque raramente ouvimos os sindicatos a colocar os problemas sérios que os professores que não são formalmente de carreira passam.
É o problema do nosso país. É tudo 8 ou 80. Tudo ou Nada. Ou somos campeões ou perdemos tudo. Ou somos heróis ou somos malfeitores.
O que seria das nossas crianças sem o profissionalismo, a competência e a total abnegação dos professores dos ensinos básicos e secundário e dos educadores?