Texto: Carlos Almeida
Salaam Aleikum é uma expressão de cumprimento utilizada por muçulmanos, significa “Que a paz esteja sobre vós”. Pode ainda não ser familiar para muitos mas a família Alshikh trouxe-a para o léxico do concelho. Composta por seis elementos, esta família síria encontrou a tranquilidade em pleno coração do Douro.
É na sua casa, bem no centro da vila de São João da Pesqueira que a família Alshikh nos recebe. À entrada, fica o calçado, uma tradição muçulmana para que as impurezas não sejam levadas para o interior da habitação. Na sala reúne-se a família que terá como porta-vozes, durante a nossa conversa os filhos Mahmoud, Reem e Malak, os mais fluentes em português.
Mohammed (pai) e Thana (mãe), acompanham o diálogo com atenção e vão respondendo aos filhos em árabe para que estes, por sua vez, nos traduzam. Musa, o mais pequeno da família Alshikh, fica sentado no sofá, mergulhado com o olhar no tablet. Não existisse a barreira linguística e este podia ser o cenário de qualquer outra família pesqueirense, que é um pouco como já se sentem.
Viver em São João da Pesqueira tem sido “muito bom”, contam-nos. Os filhos estão todos na escola e, apesar das dificuldades que vão surgindo, afirmam que recebem todo o apoio por parte de professores e colegas.
“Temos professores muito bons e atenciosos, sempre que temos alguma duvida basta chamar e tiram todas as dúvidas, mesmo que tenham que repetir duas ou três vezes.
Em Português e História temos mais dificuldades mas, por exemplo, a ciências e matemática não”, conta-nos Malak. Reem, a mais nova das raparigas diz mesmo que os seus “colegas dizem que matemática é muito difícil mas eu não acho, acho fácil”.
Mahmoud, o filho mais velho conta que já fez alguns amigos na vila, “costumamos ir ao cineteatro e ao ginásio várias vezes, ou jogar futebol. Fui bem recebido, sinto que gostam de mim e eu gosto deles também”.
A família Alshikh é natural de Alepo, no norte da Síria, de onde saíram devido à guerra em direção à Turquia, país onde viveram durante quase 6 anos, viajando depois para Portugal.
“A vinda para Portugal aconteceu de uma forma repentina, um dia no final da escola estávamos em casa e o meu pai recebeu uma chamada a perguntar se queríamos vir para cá. Disse que sim e chegamos a São João da Pesqueira uma semana depois, foi tudo muito rápido”, conta-nos Reem que nos revela ainda que mesmo antes de cá chegar já admirava Miguel Torga.
Com os pais empregados, Mohammed na agricultura e Thana numa lavandaria de uma IPSS, e os filhos a estudar. Os planos da família passam mesmo por São João da Pesqueira. Mahmoud quer formar-se na área das novas tecnologias enquanto as suas irmãs pretendem ambas ser médicas.
Manuel Cordeiro, autarca pesqueirense explica-nos que a vinda desta família respeita a preocupação da autarquia em atrair mão de obra para a região, fixando população.
“Tudo surge da preocupação da autarquia com a questão da falta de mão de obra no concelho. Contactamos o Alto Comissariado para as Migrações no sentido de lhes dizer que teríamos interesse em receber cá migrantes.
Realizamos uma reunião aqui na autarquia onde nos foram apresentadas as condições necessárias para dar andamento ao processo, designadamente as questões de habitação, emprego e acompanhamento das pessoas.
Depois disso realizamos uma outra reunião mas com empresas da região, de dimensão considerável porque era necessário que quem os empregasse também lhes desse habitação, o que acabou por ser um problema porque ninguém se mostrou disponível. A solução passou então por assumirmos nós o arrendamento da casa e assim que chegaram o pai começou logo a trabalhar na Quevedo”.
Manuel Cordeiro conta-nos que inicialmente chegaram ao município duas famílias, os Alshikh e uma outra família afegã que acabou por não se adaptar, tendo partido para outro destino. Quanto à família síria, para o autarca são já olhados como seus munícipes.
O autarca espera agora que a boa integração da família Alshikh sirva de motivação para que outros possam chegar ao concelho duriense.
“A família afegã acabou por ir embora porque não era isto que queria. A família Síria integrou-se muito bem e estão quase a fazer três anos aqui. Os filhos são excelentes alunos e estão muito bem integrados, é normal ver os miúdos a passear pela rua com os amigos.
Para nós são mais uma família pesqueirense e por nós são muito bem vindos. Gostávamos de receber muitos mais migrantes, quer para nos ajudar a colmatar a falta de mão de obra que existe na região e para fixar pessoas no nosso concelho, que é sempre um desafio.
No início quando cá chegaram houve naturalmente quem reparasse e fizesse algumas perguntas, neste momento são mais uma família que aqui anda, olhando por esse lado acho que já ninguém “repara” neles.
A língua é sempre um entrave para quem está no estrangeiro mas a equipa da autarquia que os acompanha fez um ótimo trabalho e conseguiu sempre ajudar a solucionar qualquer questão que surgia. Hoje já vão falando português e fica um pouco mais fácil”.