Numa região onde a distância geográfica entre as diferentes localidades é tão grande como no Douro, um fator essencial ao seu crescimento e desenvolvimento são as vias de comunicação, contudo é também aqui que surge o primeiro travão.
Atualmente, um dos maiores problemas da região vive-se no concelho de Sabrosa com a Estrada Municipal 323 (EM 323) em obras e limitada a veículos com menos de 12 toneladas.
A situação da EM 323 tem sido alvo de diversos alertas por parte do autarca sabrosense, Domingos Carvas que reivindica um apoio do Estado na sua requalificação, contestando a desclassificação que a estrada foi alvo em 1992, passando de nacional a municipal.
[caption id="attachment_6540" align="aligncenter" width="800"] A EM323 está a ser recuperada pelo município de Sabrosa[/caption]“Olhando para o Pinhão, desaguam ali estradas de quatro municípios: Alijó, São João da Pesqueira, Tabuaço e Sabrosa, todas elas nacionais, menos esta. Eu gostava de entender como é que, em 1992, o Governo da altura conseguiu desclassificar a estrada e entregá-la à câmara municipal sem qualquer contrapartida. Uma estrada como aquela, com a erosão do solo que tem, com uma inclinação superior a 30% em alguns locais, é uma estrada que está sempre sujeita às intempéries. Com a quantidade de saibramentos que ali foram feitos, está à vista o resultado. Não era possível que uma câmara como a nossa ficasse titular de uma via, estruturante para a região, como aquela”.
Apesar deste diferendo o autarca decidiu iniciar uma intervenção naquela via, “por questões de segurança. É uma estrada que é sobretudo uma estrada de transporte de passageiros, o que é mais grave. Por isso é que nós olhamos para esta estrada com outros olhos, com preocupação e no nosso orçamento para 2019 essa preocupação fica bem patente. Uma câmara como a nossa que tem um orçamento de 9 milhões de euros, despender quase 2 milhões numa só obra é um investimento que nos abana”.
O problema da EM 323 está sobretudo na sustentabilidade da plataforma e quantos mais pesados tivermos a circular lá pior”, diz-nos o autarca apontando esse factor e a obra a decorrer como fundamentais para a decisão de encerrar a circulação naquela via a veículos com peso superior a 12 toneladas.
Já por Tarouca o problema é na estrada Nacional 226, apesar da intervenção recente o estado daquela via é agora pior como nos diz o autarca Valdemar Pereira.
“A Nacional 226 foi intervencionada há pouco tempo, no entanto todo o alcatrão colocado está em piores condições do que se encontrava antes desta intervenção.
Há cerca de um ano, resultado de um acidente, o gradeamento de umas das pontes desta estrada nacional 226 foi destruído, encontrando-se neste local barreiras metálicas propriedade do município, com o risco de acidente ou queda dos peões que continuadamente por ali passam”.
O autarca afirma ainda que a IP tem sido alertada, contudo não existe qualquer resposta por parte da entidade pública. “A autarquia, bem como as autoridades locais, GNR, depois do acidente têm vindo a alertar para esta situação e até ao momento não obtivemos qualquer resposta por parte da IP”.
Nacional 222, uma beleza ocultada…
Classificada como uma das mais belas estradas para viajar, a Estrada Nacional 222 (EN 222), serpenteia as margens do Douro seguindo o perfil do rio, contudo são muitas as críticas apontadas à Infraestruturas de Portugal (IP) na gestão desta via, seja por motivos de segurança, quer por aspetos de limpeza.
Paulo Costa é organizador de um dos maiores eventos da região, a Meia Maratona do Douro, que percorre um troço da EN 222. Ao VivaDouro o empresário afirma que é vergonhoso o aspeto desleixado que a via apresenta ao longo de todo o ano.
“Há um problema de limpeza da estrada que é vergonhoso, aquilo é uma estrada nacional e sendo uma das mais bonitas do Mundo é inacreditável como se mantém tão suja ao longo do ano todo. Sempre que chega a altura do evento esse é um problema que tenho, conseguir que limpem a estrada.
Há recantos onde os turistas gostam de parar para tirar fotografias mas a verdade é que a paisagem está completamente bloqueada por vegetação, esse é um dos principais problemas daquela via”.
Mas não é apenas este o aspeto que preocupa o organizador da prova desportiva, a falta de rede em diversos pontos da estrada é preocupante e grave, podendo mesmo pôr em causa a vida de pessoas.
“Se uma pessoa tem o azar de ter um acidente, à noite, numa zona sem rede, bem que tem de ficar ali até que alguém apareça, isto é uma situação grave, é surreal.
Isto é absurdo, vivemos em duas realidade em que numa vemos robôs a falar e um discurso que apela a que os jovens sejam proativos no uso da tecnologia e no outro lado temos uma região onde há milhares de empreendedores jovens que não conseguem ter rede móvel para fazer um telefonema, quanto mais uma ligação de dados para enviar um email”.
… e um perigo escondido
A situação da EN 222 também é uma preocupação para os autarcas locais. Manuel Cordeiro, autarca de São João da Pesqueira esteve no final do mês de novembro com o Secretário de Estado das Infraestruturas com o objetivo de discutir o estado atual da EN 222 e da EN 222/3, saindo do encontro com a garantia que em breve se iniciarão as obras de requalificação.
Para Carlos Carvalho, autarca de Tabuaço, este é mais um exemplo da atitude do poder central face aos problemas da região.
“Infelizmente, e à imagem daquilo que é normal nos nossos territórios, esse projeto tem sido consecutivamente adiado. Nós continuamos a lutar para que ele seja uma realidade até porque seria também uma alavanca para estes concelhos se desenvolverem mais.
Infelizmente devido ao seu traçado e à zona onde se insere, a EN 222, dificilmente poderá sofrer grandes benefícios no sentido de lhe conferir a segurança máxima para o tráfego que por ali passa, seja profissional, turístico ou da vida quotidiana de quem aqui vive.
É uma preocupação grande porque a estrada não tem só o desgaste do piso pelo número de veículos que ali passa, ela sofre também o desgaste no seu suporte provocado pelos inúmeros barcos de turismo que por ali passam. Entendemos que nem uma coisa nem outra possa parar, devemos é criar as condições necessárias para que esses fluxos se façam em segurança.
Aquilo que defendemos, e que faz parte do Plano Rodoviário Nacional, é uma ligação a uma cota superior e que permitiria unir a A24, desde o nó de Valdigem a Armamar, Tabuaço e São João da Pesqueira o que mudaria completamente a realidade da N222 que ficaria quase exclusivamente para o uso turístico resolvendo assim uma boa parte dos problemas”.
[caption id="attachment_6541" align="aligncenter" width="800"] Na EN222 um dos problemas é a queda de pedras para a via[/caption]Porta de entrada para muitos turistas, a cidade de Peso da Régua está também ligada à EN 222 e José Manuel Gonçalves, autarca reguense, defende que este não é um problema dos concelhos por onde a estrada passa mas de toda a região.
“Cada vez mais temos que olhar para o nosso território como um todo, não posso só olhar para os problemas no meu concelho e nesta questão das estradas isso é ainda mais uma verdade. Os problemas que atualmente se registam seja na N108 seja na N222 preocupam-nos a todos porque nos afetam a todos.
O turismo que cresce todos os anos é ótimo para a região mas também nos deixa mais expostos, no caso da haver um acidente grave numa das nossas estradas isso vai-se refletir em toda a região, basta ver o que aconteceu com a queda da ponte de Entre os Rios que fica fora da nossa região mas a verdade é que o mercado do turismo fluvial caiu nos anos seguintes ao acidente, de forma drástica”.
Duas pontes, dois problemas
É ainda na Capital do Douro que encontramos outros dois problemas graves que a autarquia afirma estar atenta e para os quais vai alertando periodicamente a IP, a ponte rodoviária e a ponte pedonal, ambas a ligar os concelhos de Régua e Lamego, separadas por poucos metros de distância.
“Do ponto de vista da segurança a situação mais preocupante que temos é a ponte rodoviária que liga Régua a Lamego. É frequente verificarmos que os pesados muitas vezes acabam por galgar os passeios para que consigam passar e, como toda a gente sabe, aqueles passeios são suspensos, foram criados apenas para o trânsito pedonal.
É uma situação que já reportamos à IP, inclusivamente, numa reunião que tive com eles levei uma proposta técnica, elaborada por elementos da autarquia, de reforço do tabuleiro para podermos resolver aquela situação, contudo o entendimento deles é que a situação não inspira preocupações, chegando mesmo a alegar que o trânsito que afirmamos ter não corresponde à realidade porque os pesados normalmente não utilizam aquela via mas sim a ligação por autoestrada, o que sabemos que não corresponde à realidade.
Para nós, e atendendo à experiência que temos do passado com registo inclusive de um acidente grave, é uma situação preocupante. Esperamos nunca ter razão. Aquilo que nos compete é informar e alertar as entidades competentes e isso já o fizemos.
Uma outra situação que nos tem vindo a preocupar e que também é da responsabilidade do instituto público, é a nossa ponte pedonal. A Câmara Municipal, na altura em acordo com a IP, conseguiu o financiamento para a obra e cedeu-lhes esse financiamento, agora a manutenção é da responsabilidade deles, o facto é que atualmente a ponte não tem iluminação e agora no inverno ou de noite acaba por causar alguns problemas e alguma insegurança. Há uns meses atrás deram-nos a garantia que no prazo de seis meses a situação estaria resolvida, o que é certo é que esse prazo se está a esgotar e até agora não vemos nenhuma alteração da situação.
Os feedbacks que vou tendo em termos estruturais é que a ponte é segura, obviamente que a mim me compete questionar depois resta confiar que a IP esteja efetivamente a monotorizar a situação e que nos informem caso haja alguma alteração para serem tomadas medidas”, afirma o presidente da Câmara Municipal da Régua.
Uma questão de limpeza
Se a EN 222 tem problemas de limpeza da vegetação não é exemplo único na região. Vítor Ferreira, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Alijó, afirma à nossa reportagem que esta é uma realidade que afeta, de forma geral, as estradas nacionais da região.
“A IP focalizou o centro de atenções de limpeza na zona mais a norte do distrito de Vila Real, a parte sul ficou mais ao abandono e foi notória a vegetação a circundar as estradas nacionais”.
Também o autarca tabuacense falou à nossa reportagem sobre a limpeza das vias e a diferença entre a gestão municipal e a gestão da IP num ano em que a atenção à volta deste assunto foi muita.
“Este ano a vergonha foi ainda maior porque todas as estradas municipais tinham as suas zonas envolventes limpas (por causa dos incêndios mas também por uma questão de turismo), e a grande estrada nacional que atravessa a região, a N222, teve todo o verão com vegetação com mais de um metro de altura, isto numa altura em que havia vários eventos a decorrer transmitidos na televisão, uma vergonha”.
[caption id="attachment_6543" align="aligncenter" width="800"] A ponte de Carrapatelo preocupa autarca de Mesão Frio[/caption]Falta de comunicação entre entidades
Numa região desenhada pelas vinhas, com escarpas altas podem ser habituais alguns deslizamentos de terras ou quedas de pedras, por exemplo, contudo, no entender de Vítor Ferreira a autarquia de Alijó, alguns desses problemas poderiam ser evitados com uma maior comunicação e intervenção dos diferentes atores.
“Os projetos VITIS e outros semelhantes são analisados e aprovados pelo IFAP e pelo Ministério da Agricultura. Não há qualquer interligação entre estas entidades e quem gere as vias, sejam elas municipais ou nacionais. O que acontece é que nesses projetos é que depois há desvios de linhas de água que vão acabar por causar problemas porque os escoamentos que estão feitos estão pensados para uma realidade diferente. Eu questiono se, naquelas intervenções próximas às estradas, não devia de haver uma posição mais ativa de quem gere essa via, em especial a IP através de um parecer vinculativo”.
Nacionais 108 e 101 preocupam Mesão Frio
Em Mesão Frio encontramos duas situações para as quais o autarca, Alberto Pereira, tem vindo a alertar, a EN 108, que liga Mesão Frio à Régua e a EN 101 que liga a Porta do Douro a Amarante.
No caso da ligação à Régua, a preocupação são os abatimentos que a estrada apresenta e que têm vindo a acentuar-se ao longo do tempo.
"A estrada, há cerca de dois anos, apresenta várias depressões daqui até à Régua que se vão agravando. Sei que está constantemente a ser fiscalizada pelos técnicos da Infraestruturas de Portugal, eles dizem que não há problema nenhum, no entanto o assunto foi reportado à IP. Espero que agora com estes alertas todos eles realmente levem por diante uma intervenção na estrada."
Outro problema que o autarca de Mesão Frio refere é o estado da EN 101, que liga Mesão Frio a Amarante, em especial a ponte de Carrapatelo, “Já não serve de forma alguma os interesses económicos. É uma estrada importantíssima para a economia local, onde circulam diariamente vários autocarros com turistas e veículos de transporte de vinho, e tem havido alguns constrangimentos de trânsito”.
Falta de investimento
A reivindicação é feita por Carlos Carvalho, a reprogramação de fundos deve ser aproveitada para alocar verbas para a requalificação destas vias.
“Umas das nossas batalhas com o Governo, nesta reprogramação de fundos, é que a nossa rede viária seja englobada. Há a ideia que a União Europeia diz que para Portugal não há mais estradas mas estas já existem e precisam ser mantidas nas melhores condições e não podem ser as autarquias a fazer essa manutenção. Ao longo dos anos o poder central foi desclassificando estradas e entregando-as aos municípios e agora nós temos um encargo nas mãos que é pesadíssimo e que a breve trecho vai começar a refletir-se nos nossos orçamentos.
Esta ideia do Governo de passar todas as estradas para a gestão municipal é um presente envenenado e muito dificilmente aceitaremos essa pretensão, a menos que sejamos obrigados. Temos o exemplo da N323 que foi desclassificada depois de requalificada mas passados dois anos as Águas de Trás-os-Montes rebentaram a estrada para fazer a ligação de condutas e hoje a estrada está num estado lastimável, completamente destruída e agora não sabemos o que fazer. Não há envelope financeiro que suporte esta realidade.
Temos que ter o engenho de, nas negociações com Bruxelas no âmbito do Portugal 2030 nós sejamos capazes de colocar esta problemática sob pena de vir a transformar grande parte do nosso país numa realidade ainda menos desenvolvida do que aquilo que hoje em dia vivemos.
Independentemente da falta de apoio do Governo nós vamos conseguindo, com muito esforço, minimizar esse constrangimento mas, se chegarmos ao ponto de ficar tudo sobre os nossos ombros então já não sei. Bastava ver o investimento que os sucessivos governos têm feito nesta área a não ser aquele que é comparticipado pela EU. Aqui em Tabuaço não tenho memória de algum investimento feito pelo Governo nos últimos anos”, contesta o autarca.