O processo de reabertura das minas de ferro de Torre de Moncorvo tem sido longo mas agora, com a assinatura do contrato de venda à Aethel Mining, está próximo do fim. Em entrevista exclusiva ao VivaDouro o autarca moncorvense, Nuno Gonçalves, garante a reabertura até 14 de março.
O autarca social-democrata adiantou também que está prevista para o próximo mês de fevereiro uma sessão de esclarecimento pública, dirigida à população do concelho e outros interessados, com a finalidade de apresentar o projeto mineiro, agora gerido por uma empresa britânica “detida exclusivamente” pelo português Ricardo Santos Silva e a americana Aba Schubert.
Estas minas são o segundo maior depósito de minério de ferro da Europa.
Confirmada a passagem da exploração das minas de ferro de Moncorvo para as mãos da Aethel Mining, que data aponta para o início dos trabalhos de mineração?
Os prazos estão definidos como estavam já definidos para a MTI, aliás, eles são definidos pelo próprio RECAP (Relatório de Conformidade do Projeto de Execução) e que foi aprovado sem condicionantes, impondo que a abertura aconteça, no máximo, até ao dia 14 de março.
Sendo que a Aethel está a cumprir o que a MTI estava a prever, vai acontecer ainda durante o mês de fevereiro uma sessão de esclarecimento à população e depois entre 1 e 14 de março acontecerá a reabertura das minas.
A parte do concentrado de ferro é uma segunda parte, nesta primeira fase é mais para os agregados que se conseguem fazer com o minério de ferro de Torre de Moncorvo.
Estava prevista a criação de cerca de 500 postos de trabalho com a reabertura das minas, esta previsão também se mantém?
A previsão é que nos primeiros dois anos sejam criados cerca de 200 postos de trabalho que irão aumentar ao longo dos primeiros 6 anos de laboração.
Inicialmente também estava previsto um investimento de 114 milhões de euros, valores esses que se mantém.
Será o mesmo timing e os mesmos números que já estavam previstos, havendo aqui apenas uma pequena nuance que é, como já referi, a situação do concentrado de ferro que acontecerá numa segunda fase.
Na seleção do pessoal para ocupar esses lugares há algum critério que privilegie os munícipes de Moncorvo?
O que sempre tratamos com a MTI foi a garantia que sempre que houvesse mão de obra no concelho essa seria a prioridade e isso deve manter-se.
Não é de agora a vontade da autarquia em reabrir estas minas. Sabendo já que serão criados todos esses postos de trabalho, que outras vantagens vê neste processo?
Eu penso que temos de olhar a reabertura das minas de ferro de Torre de Moncorvo na ótica nacional. Um país que tem recursos naturais não pode estar de costas voltadas para eles e infelizmente Portugal está, há muitos anos, de costas voltadas para os seus recursos naturais.
O que estamos a falar é de benefícios não só para o nosso concelho mas para toda esta região e para o próprio incremento do PIB nacional. Portanto, nenhum país se pode dar ao luxo de ter a segunda maior jazida de ferro da europa fechada, quando pode ser explorada a céu aberto.
Também não podemos esquecer uma questão que é fundamental. No início deste mês foi a votação final do Orçamento de Estado, o Senhor Primeiro-Ministro diz que este é um orçamento focado nas alterações climáticas e na demografia, ora, quanto à demografia estamos num território a que chamam de baixa densidade (normalmente refuto este pré-conceito afirmando que estou num território de alta intensidade, pela resiliência e perseverança das pessoas em se manterem, em criar emprego, etc). Até nesse aspeto a reabertura destas minas é importante.
O ordenamento do território, e de todo o litoral, exige que seja com produtos de qualidade e ficou demonstrado que os únicos molhes que resistiram às intempéries foram os de Sines e Leixões, curiosamente ambos feitos com minério de ferro das minas de Moncorvo. Portanto, quando estamos a pensar o reordenamento de todo o litoral devemos também pensar que temos matéria prima nacional e que escusamos de importar, é só “meter as mãos na massa” como se costuma dizer, e aplicar o que temos. Desta forma também ajudamos a que este território possa também atrair jovens, altamente qualificados e outros menos qualificados, mas que aqui encontrarão emprego, contribuindo assim para algo ainda maior que é a sustentabilidade do território.
Outro aspeto é que assim poderemos dar um volte face naquilo que eu chamo o duplo desperdício do litoral porque o litoral cada vez tem mais fundos mas também tem cada vez mais população. Quando os fundos são aplicados para resolver uma situação, já não são aqueles que seriam necessários, já são necessários mais porque já tem mais população e isso leva ao duplo desperdício.
Estas minas estão longe da polémica que tem acontecido com as minas de lítio em Montalegre. Pode assegurar que elas não acarretam nenhum tipo de problema para os lençóis freáticos ou para o ambiente?
Não acarreta nenhum problema para os lençóis freáticos. O RECAP e o Estudo de Impacte Ambiental (EIA) foram muito importantes por isso mesmo. Todo este processo começou na etapa zero para que daqui a 5, 10 ou 15 anos não haja impacto ambiental. Este foi talvez o estudo que maior número de horas levou para se perceber que não há intervenção agressiva no ambiente. Obviamente que é uma unidade de produção com tudo o que isso pode significar mas garantidamente não acarreta nenhum perigo a nível dos lençóis freáticos nem na qualidade de vida das pessoas.
A população pode estar completamente tranquila quanto a isso?
Completamente tranquilos porque a monotorização a que foi obrigado este EIA foi extremamente rigoroso. Esta é mesmo a razão pela qual adiamos algumas vezes a data da reabertura das minas porque era sempre necessário mais um estudo, fosse para a fauna e flora ou inclusivamente para os próprios habitantes de todas as localidades que estão à volta das minas.
Tem havido diversas entidades e personalidades a manifestarem preocupação com a exploração mineira próxima da área contemplada no Património da Humanidade. Esta é uma situação que o preocupa no caso das minas de ferro de Torre de Moncorvo?
As minas de ferro de Torre de Moncorvo já tiveram, elas próprias, o impacto de estarem numa Zona Especial de Proteção (ZEP). A primeira solução de transporte do minério até ao Pocinho era uma passadeira a toda a extensão, isso foi chumbado pelo impacto ambiental que podia ter na ZEP.
Eu continuo a dizer que o Património da Humanidade é importante para nós e ninguém mais que os autarcas o querem preservar. O que nós dizemos é que, a forma como está estruturada a ZEP, não pode ter as mesmas condicionantes da zona do Património da Humanidade.
Se compararmos, por exemplo, Peso da Régua com Torre de Moncorvo, nós só temos uma pequena área inserida na área considerada Património da Humanidade, o resto está em ZEP, ou seja, tem as mesmas condicionantes.
Quando falamos de determinados recursos minerais e determinadas explorações, devemos sempre ter em conta essa mais valia que foi o Património da Humanidade. Contudo não podemos pôr em causa o investimento, as duas coisas têm que ser pensadas em conjunto. Se nos formos concentrar no discurso radicalista que alguns trazem para o Património da Humanidade, hoje provavelmente não existiriam os socalcos nas vinhas, porque são resultado da intervenção humana. Portanto, isso é um contrassenso.
Hoje o que os turistas vêm ver, aquilo que a UNESCO quer preservar, é aquilo que é fruto do trabalho de homens e mulheres que arduamente, de sol a sol, fizeram. Eu não posso aceitar que alguns venham dizer que tudo é possível na fauna e flora exceto a intervenção do Homem porque se o Douro Vinhateiro recebeu esta distinção, ela resulta do trabalho dos homens e mulheres do Douro.
Se não tivermos ninguém a habitar a região podemos ter todas as espécies mas há uma que certamente ficará em vias de extinção, que é o Homem.