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Manuel de Novaes Cabral: “Tudo o que é importante para a Região Demarcada do Douro é importante para Portugal”
[caption id="attachment_1499" align="alignleft" width="300"] Manuel de Novaes Cabral, presidente do IVDP[/caption]
Manuel de Novaes de Cabral assumiu em novembro de 2011 o cargo de presidente do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto. O VivaDouro esteve à conversa com o dirigente.
Licenciado em direito, diretor municipal da presidência de Câmara do Porto, chefe de gabinete do ministro das obras públicas, docente universitário, como é que surge a área do vinho na vida de Manuel Cabral?
Eu nasci numa família ligada ao vinho. Lembro-me de em miúdo estar num quarto em cima dos lagares onde o mosto fervilhava e portanto toda a vivência das vindimas e do ciclo da vinha é algo que me diz muito desde sempre. Depois desenvolvi a minha formação em direito, fui fazendo a minha vida profissional tendo entretanto trabalhado durante muitos anos na Comissão de Coordenação da Região do Norte e nessa altura surgiu oportunidade de candidatar o então presidente, Luís Braga da Cruz, a uma organização europeia de região vitícolas, que é uma organização que na altura envolvia cerca de 50 regiões vitícolas europeias de 11 países.
Portanto esse é o primeiro cargo ligado ao setor?
Sim, para além das minhas vivências enquanto mais novo ao ciclo da vinha o primeiro cargo é esse. Coube-me a mim preparar a candidatura do engenheiro Luís Braga da Cruz, ele foi eleito presidente dessa associação em 1998 e propôs-me para secretário-geral dessa organização. Exerci essa função durante praticamente quatro anos. Isto permitiu-me conhecer basicamente duas coisas: a europa vitícola na sua globalidade e diversidade e depois o processo de decisão comunitário. Depois mais tarde durante oito anos e meio representei a Câmara do Porto na assembleia da Rede de Capitais dos Grandes Vinhedos que envolve várias regiões vitícolas de todo o mundo, o que me permitiu ter uma visão muito mais alargada daquilo que é o mundo do vinho. Sendo o vinho um elemento importantíssimo para a projeção internacional entendíamos que essa plataforma era importante para interagir primeiro com o setor segundo com a região. O Douro e o Porto estão umbilicalmente ligados. O Porto não seria o mesmo sem o Douro tal como o Douro não seria o mesmo sem o Porto. Portanto aquela diferença do que era a produção “Douro” e o comércio “Porto” cada vez menos existe então se falarmos hoje no chamado enoturismo isto é algo que entra pelos olhos dentro. Não há turismo no Douro sem passar pelo Porto. O Porto é uma porta de entrada não apenas para o Douro mas para toda a região, mas em particular para o Douro porque tudo aquilo que este representa.
Como é que surgiu a nomeação do Governo para o cargo de presidente do IVDP? Qual foi o feedback que sentiu?
Apesar de eu não ter uma ligação direta em termos de propriedade ao Douro, a minha família foi do Douro para o Porto no fim do século XVIII. Tenho muita ligação familiar ao Douro. Portanto o facto de eu sentir o Douro, de respirar o Douro e de ter tido responsabilidade em organizações internacionais através das quais mantive sempre uma ligação muito forte ao Douro, vi isso como quase natural. Foi uma coisa na qual eu nunca pensei, tendo em conta o meu percurso de vida. Também nunca fiz desenhos muito específicos das coisas que ia fazer futuramente. Devo dizer que foi quase natural e foi um processo muito rápido.
Pegando um bocadinho na situação que encontrou quando tomou posse do cargo, quais foram os principais desafios que sentiu?
O meu primeiro desafio foi a reorganização institucional desta casa.
Essa reorganização era para si uma questão importante?
Foi uma questão importantíssima porque o instituto estava desde há muitos anos assente na união de duas casas, o Instituto do Vinho do Porto e a Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro. A casa foi reestruturada nas suas direções exatamente naquilo que são as suas principais funções e áreas de intervenção e atividade. O segundo aspeto que eu mencionava também tem a ver com instituições, mas neste caso com a rede institucional. O Douro tem uma debilidade institucional grande que se contrapõe com duas coisas, uma delas é o reforço das instituições e a outra é a rede. Se as instituições não trabalham em rede as coisas são muito mais difíceis. É necessário trabalhar muito em alguns caminhos naquilo que são as soluções e naquilo que é a estrutura da vinha e do vinho nas suas diferentes vertentes que vai desde a plantação até à comercialização.
A produção diz-nos que este ano subimos 15% feita a analogia com o ano transato. Qual é o principal motivo deste crescimento?
A vindima 2015 foi muito boa. É um ano de produção muito bom, em termos qualitativos e em termos quantitativos crescemos. Não crescemos tanto quanto as projeções deram em abril. O mercado mundial de vinho é altamente competitivo e temos que ir um pouco atrás no tempo para perceber a história e o seu contexto. O nosso vinho é sempre o melhor do mundo, o vinho do Porto tem uma história importantíssima, mas não podemos ser autistas, temos que ser realistas e o mercado não é elástico, sendo altamente concorrencial. Se baixamos a guarda num determinado mercado, há sempre outras regiões e vinhos que estão na calha para agarrar aquele mercado. Temos que estar muito atentos e presentes nos mercados que temos, nunca podemos considerar um mercado como nosso. A região demarcada do Douro na sua totalidade, representa 50% das exportações de vinhos portugueses e se pegarmos só nos vinhos com dimensão de origem e com dimensão geográfica, os vinhos da região representam 76% das exportações de vinho português. Só o vinho do porto representa 43% das exportações de vinho.
Quais são os principais mercados do vinho do Porto?
O vinho do porto está em todo o mundo, estamos em cerca de 120 mercados, há mais países, mas são muito pequenos, portanto, estamos em todo o mundo. Sendo que o vinho do Douro está em cerca de 100 mercados.
Podemos chamar-lhes mercados tradicionais a esses mercados principais?
São mercados tradicionais. Dos 10 primeiros mercados que absorvem cerca de 90% da comercialização, oito são da Europa e apenas dois são de fora, os Estados Unidos e Canadá, todos os outros são da Europa. O que também tem significado. O vinho do Douro que está neste momento em quase 100 países tem a situação quase inversa em termos de mercados. O vinho do porto exporta cerca de 85% da sua produção e os vinhos do douro exportam cerca de 40% da produção. Está a crescer muito rapidamente a quota de exportação do vinho do Douro. O mercado nacional do vinho do porto está a crescer. A quota de exportação do vinho do Douro está a crescer, portanto há aqui um movimento inverso. É preciso que às vezes tenham muito cuidado e aquilo que eu costumo dizer é que o vinho do porto deve procurar novos mercados, mas nunca pode negligenciar o trabalho dos mercados tradicionais, porque isto também entra pelos olhos dentro.
Portanto, se não estou em erro, a França lidera aqui o melhor mercado.
É um belíssimo mercado, a frança ultrapassou o Reino Unido em 1963. Para o francês médio o vinho do porto é um vinho aperitivo. Mas há aqui um trabalho que está a ser feito e que está a ter alguns resultados, no sentido de fazer perceber aos franceses que o vinho do porto não é apenas um vinho aperitivo e que pode ser bebido depois da refeição como os ingleses fazem.
Ou seja, o mercado inglês continua a ser muito mais conhecedor que o mercado Francês?
Admito isso, mas não queria, acho que não é legítimo tirar essa conclusão mas admito que sim. Mas não é uma conclusão que eu consiga tirar porque acho que era preciso desenvolver um bocadinho mais sobre o assunto, agora, tem havido um esforço muito grande por parte das empresas e do Instituto no sentido de mostrar várias coisas, eu costumo dizer, o vinho do Porto é um vinho muito tradicional, que não quer perder esse sentido tradicional, mas tem de encontrar inovação, voltando à região. Eu não tenho dúvidas em afirmar que a região demarcada do Douro é das mais Inovadoras do mundo, mesmo comparando com o novo mundo, em termos de vinha, e em termos de vinho. Aqui a UTAD tem um papel muito importante pelo facto de haver uma grande circulação de informação de pessoas por todo o mundo, isso é importantíssimo no sentido de nos trazer novas formas de olhar para a vinha e o vinho. O nosso esforço e das empresas, e repare, eu sublinho sempre que o instituto não tem um papel autónomo, o instituto trabalha com as empresas, com os produtores, com os viticultores. O nosso papel com as empresas vai muito no sentido de encontrar novas formas de consumo, novos momentos de consumo, para chegar a novos consumidores. Sem perder o tradicionalismo, tudo isto é compatível mas nós temos que ser imaginativos e ser capazes de não perder duas coisas, não perder a tradição, porque a tradição é importante mas não perder a capacidade de inovar e nós temos feito isso.
Quais são os próximos mercados que irão tentar atingir? Já estão determinados? Não, o que eu lhe posso dizer em relação a isso é que temos os mercados completamente definidos e estabilizados, por exemplo, França, EUA, Brasil. Depois há outros mercados onde vamos desenvolvendo ações e há mercados que queremos experimentar, são as ações de manutenção ou experimentação, e aí estamos a falar em Espanha, Alemanha, nos Países Nórdicos ou na China e Rússia, apesar de aqui a instabilidade política ser um fator determinante.
Entrando na questão do enoturismo, este setor tem beneficiado com o fato do Porto estar na moda, se uma coisa leva à outra, levando a procura também para o Douro e para o vinho do Porto?
“O Porto está na moda mais do que o Douro? O que é que o Douro tem a ver com o facto de o Porto estar na moda?”Respondo com estas duas perguntas porque o Douro tem muito a ver com o facto de o Porto estar na moda. Se eu tivesse que pôr um quarto vetor, eu escolhia o território. Território na perspetiva da cultura, do património, da economia, quando falo do território é disto. É evidente que há aqui uma dimensão Porto que é muito importante. Não podemos falar na projeção do Porto sem falar na projeção de Portugal, tudo isto está ligado. A região demarcada do Douro é um elemento que encontra referido em grande parte dos produtos do vinho do Porto. Há aqui uma interação brutal entre o que é o Porto e o Douro. Para mim, esta é a ligação que eu chamo umbilical e incindível e ela tem crescido. Quanto mais elementos tivermos de atração, mais ganhamos todos e aqui há um trabalho que é muito importante, o trabalho em rede, isso é muito importante e não se pode restringir ao Douro. Quanto mais nós trabalharmos de “braço dado” mais ganhamos, todos. É isso que eu acho que temos que dizer cada vez mais e com mais força e mais alto.
Planos que estão em cima da mesa para o futuro do IVDP?
Há aqui um trabalho de muitos anos de plantação, respetivamente à agricultura, que queremos tratar muito bem aquilo que plantamos e esperemos que se fortifique. Tenho muito respeito pela história desta casa e por tudo que foi feito por todos os meus antecessores, como IVDP. Há aqui um trabalho de continuidade que é muito importante. Temos agora um desafio muito grande que é pôr o conselho interprofissional com as fortíssimas responsabilidades que tem a trabalhar, ou seja, pôr o comércio e a produção a trabalhar de uma forma interativa connosco, portanto, este tripé que é a produção, o comércio e o Estado têm que trabalhar cada vez mais de braço dado. Há muitos desafios que têm a ver com o território, com a produção, com os vinhos, a comercialização e que têm que ser trabalhados conjuntamente. Se não existir um bom diálogo e uma boa interação e um trabalho muito grande de rede com a produção e com o comércio, nós não vamos a lado nenhum. Para mim este trabalho é o principal desafio que temos para os próximos anos.
Quer deixar uma mensagem para os produtores do Douro?
O futuro vale a pena.