[caption id="attachment_3259" align="alignleft" width="300"] Fernando Bianchi de Aguiar, coordenador da candidatura do Douro a Património Mundial/ Foto: Miguel Almeida[/caption] Cerca de dois meses depois de a região completar 15 anos enquanto Património da UNESCO, o VivaDouro inicia nesta edição uma série de conversas com várias personalidades acerca da evolução do território nestes últimos anos. Leia a entrevista a Fernando Bianchi de Aguiar e fique a conhecer o retrato que o coordenador da candidatura do Douro a Património Mundial faz da região ao longo destes quinze anos. Como é que surgiu a iniciativa da candidatura do Alto Douro Vinhateiro (ADV) a Património Mundial da UNESCO? A concretização da candidatura do Alto Douro Vinhateiro a Património Mundial da UNESCO deve-se à Fundação Rei Afonso Henriques (FRAH), uma instituição luso-espanhola, presidida nessa altura pelo Dr. Miguel Cadilhe, que liderou e financiou todo o processo. A ideia tinha, contudo, surgido uns anos antes, em 1993, por uma iniciativa conjunta da Associação Comercial do Porto, do Instituto do Vinho do Porto, da Confraria do Vinho do Porto e da Casa do Douro. Como presidente do IVP lancei esta ideia aos presidentes das três instituições e neste contexto fiz os primeiros contactos com a Missão Permanente de Portugal na UNESCO em Paris presidida, na altura, pelo Professor José Augusto Seabra, de quem recebi incondicional e entusiástico apoio. Considera que existiu um grande envolvimento das autarquias e demais entidades públicas e privadas ao longo do processo? Houve a preocupação, por parte da FRAH e dos seus Presidentes, de garantir um envolvimento formal das autarquias e demais entidades públicas e privadas em dois momentos determinantes do processo: antes do requerimento da inclusão do Alto Douro Vinhateiro na lista indicativa do património mundial, com a assinatura de um documento de Apoio Regional no qual se definiu a estratégia a utilizar e se validou a minha coordenação e, já na fase final, ao subscreverem um Protocolo de Compromissos relativo à gestão e salvaguarda da paisagem Duriense onde se assumia, nomeadamente, a intenção de realizar um Plano intermunicipal de Ordenamento do Território (PIOT) para a área candidatada. A CCDRN, presidida por Braga da Cruz, simultaneamente Presidente da FRAH no mandato seguinte ao de Miguel Cadilhe, assumiu um papel liderante no envolvimento das autarquias e de toda a sociedade civil através de inúmeras associações, na concretização deste ultimo protocolo. Como é que foi a experiência de coordenar uma equipa multidisciplinar? A primeira referência que gostaria de fazer foi a rapidez com que se conseguiu produzir todas as peças escritas necessárias para promover a inscrição. Em menos de três anos de trabalho a inscrição estava concretizada.  Este feito deve-se primeiro à preparação da entidade promotora, a FRAH, que tinha realizado um aprofundado e muito bem documentado “trabalho de casa” para a decisão interna e, um segundo lugar, a uma grande dedicação de toda a equipe que para além da sua competência e muito boa preparação para trabalhar os temas acordados, manteve-se a trabalhar sem interrupção nos meses usuais de férias, até à conclusão de todos os estudos e relatórios. Em 2001 o Alto Douro Vinhateiro (ADV) foi considerado como Património Mundial da Humanidade. Cerca de 15 anos depois desta classificação qual é o retrato que faz da região neste momento? Por solicitação do Comité do Património Mundial da UNESCO em junho de 2012, no decurso da polémica da barragem da Foz do Tua, foi elaborado um relatório do estado de Conservação do Bem, decorridos 10 anos da sua inscrição na lista do Património Mundial. Um dos objetivos deste relatório, apresentado em 2013, foi olhar a evolução da paisagem do ADV nos últimos dez anos e a sua gestão. Não tive uma participação direta na sua elaboração, mas revejo-me no essencial nas suas conclusões bem fundamentadas nos dados recolhidos e trabalhadas. Acresce que nas cerimónias das comemorações dos 10 anos da classificação fui convidado a fazer uma reflexão sobre o tempo já decorrido e o balanço em relação às minhas expectativas. Vou sintetizar os tópicos que as duas “radiografias” fizeram na altura assumindo que nos cinco anos que entretanto passaram não aconteceu nada de muito relevante. A transformação mais significativa da paisagem do ADV nos últimos 10 anos foi a evolução dos sistemas de armação do terreno ocorrida numa década de intenso investimento na RDD. A restruturação da vinha continuou com base no modelo de patamar largo (PDRITM), solução considerada como uma intrusão expressiva na paisagem e destruição de património vernacular. O relatório refere-se, no entanto, ao aparecimento cada vez mais expressivo de sistemas mais inovadores e conciliadores da conservação do património. O primeiro modelo prevaleceu largamente sobre o segundo, mas os patamares estreitos estão a tornar-se numa prática comum. Atribui-se esta circunstância a um modelo de gestão frágil e descontinuado e ao desfasamento no tempo entre a tomada de medidas para a gestão do Bem, a fase de operacionalidade e a obtenção de resultados. As dissonâncias ambientais de caráter pontual têm vindo a ser mitigadas embora permaneçam situações incompreensíveis que deveriam ser alvo de uma estratégia de intervenção atempada e rigorosa. Conclui-se neste ponto com uma visão contudo positiva. A Autenticidade do ADV prevalece e continua a perpetuar a procura de soluções de sustentabilidade como é o recurso aos patamares estreitos, aos micropatamares, à conservação dos muros, ao fomento da biodiversidade, a diversificação das castas e manutenção do património genético da videira são indicadores favoráveis à presente afirmação. Sobre a Gestão a principal conclusão foi o reconhecimento da necessidade de um sistema de monitorização e de relato promovido num ambiente de alargada participação institucional e do público. Esta certificação foi ou não uma mais-valia para a região? A visibilidade interna e externa do Douro Vinhateiro cresceu com o enorme crescimento da sua notoriedade em temas para lá da vinha e do vinho. Criou-se uma expetativa que poderia ser um remédio para muitos dos seus problemas, o que se verifica que era um claro exagero. Que novas oportunidades se criaram com esta Chancela nas várias áreas? Foram também desenvolvidos outros setores de atividade como o turismo sendo que esteve até à data estruturada – talvez em excesso, à volta da navegabilidade do rio Douro. Só mais recentemente alguns novos projetos e equipamentos foram surgindo explorando devidamente a viticultura de excelência da região e o seu maior ativo que designamos genericamente por uma palavra francesa - o terroir. Novos centros de interpretação de grande qualidade arquitetónica e bons programas de acolhimento dos turistas têm valorizado a visita e a permanência do território, que como todos sabemos, não é um grande atributo do turismo fluvial. O turismo no Douro tem sido assumido como elemento chave e catalisador do desenvolvimento regional mas, apesar da sua evolução positiva, o ADV não é, felizmente, um lugar de turismo de massas. O setor vitícola é o motor económico e social da região. Como é que classifica a evolução deste setor nos últimos 15 anos? Os últimos 15 anos foram de expansão da atividade económica com investimentos significativos na vinha, ainda com um forte apoio público (Programa Vitis) e com a reestruturação de mais de 15.000 hectares de vinhas. Recordo que, nos vinte anos que antecederam a inscrição do ADV decorreu o PDRITM (Projeto de Desenvolvimento Rural Integrado de Trás-os-Montes), que revolucionou a região vitícola com a introdução de novos sistemas mecanizados de cultura (vinhas em patamares e vinha «ao alto»).  Nos mais de trinta anos já decorridos, 50% da área vitícola da região foi reestruturada o que é um feito notável que se deve ao dinamismo dos viticultores durienses. Este dinamismo constituiu uma pressão enorme sobre os sistemas tradicionais de armação do terreno assentes nos muros de xisto e outros elementos de excelência da paisagem vitícola de encosta – grande desafio – mas um contributo fundamental para ultrapassar as dificuldades de competitividade, devido, essencialmente, ao envelhecimento da vinha, à baixa produtividade e à escassez de vinhas acessíveis - problemas intrínsecos da vida social e económica de então a que estava também associado o aumento do custo da mão-de-obra.  Não é o tema desta conversa mas referirei a importância, para a resposta à pergunta que me fez, da estabilidade institucional do setor do Vinho do Porto que parece encontrada …  A Chancela da UNESCO contribuiu para alavancar mais este setor? A visibilidade internacional, e mesmo nacional, resultado pela divulgação inerente à colocação do ADV na lista do Património Mundial deu certamente vantagem considerando a crescente utilização do símbolo Património Mundial nas mensagens de comunicação tanto dos vinhos como da oferta turística da região. O ADV é uma paisagem cultural evolutiva viva, sendo uma obra combinada do Homem e da natureza ao longo dos anos. Esta herança foi passando de geração em geração e hoje em dia muitas das quintas e alojamentos rurais estão sob a gerência de “novas gerações”. Está assim aberto um novo capítulo para o ADV? Qual tem sido o contributo destas novas gerações no desenvolvimento da região? Quem visitar o Douro Vinhateiro constata que muita coisa mudou para melhor, menos do que todos gostaríamos. O interesse pelo Douro cresceu e sabemos, por exemplo, de famílias de enólogos que se fixaram na região. É um movimento que os sensos começam a quantificar, mas com números ainda pouco expressivos. Recuando novamente no tempo, a candidatura do ADV a Património Mundial tinha também como objetivo contribuir para o “aumento da autoestima dos viticultores do Douro através do reconhecimento do valor do seu trabalho”. Considera que esse objetivo está neste momento comprido? Não sei responder a essa questão, mas recordo-me muito bem o uso insistente que fiz dessa ideia, por uma simples razão. Os Durienses não se revêm na designação do seu produto principal, o vinho do Porto, pois compreensivamente põem em destaque a cidade onde se iniciam as exportações que o projetaram mundialmente. Alto Douro Vinhateiro património mundial é uma designação bem explícita e que pôs em destaque esta região e a sua paisagem de excelência, trabalho seu. Eu como português e nortenho que sou tenho imenso orgulho neste reconhecimento da UNESCO. Nas minhas funções internacionais senti mais autoestima e muito orgulho por ter trabalhado nesta candidatura e profissionalmente na região, em diversas funções e fases da minha vida profissional, com principal destaque dos 36 anos em que fui professor da UTAD. [caption id="attachment_3260" align="alignleft" width="300"] Fernando Bianchi de Aguiar, coordenador da candidatura do Douro a Património Mundial/ Foto: Miguel Almeida[/caption] O Douro Património da Humanidade é, ainda, um espaço desfavorecido que apresenta indicadores económicos e sociais que o colocam ainda aquém de outras regiões, nomeadamente a constante desertificação dos territórios. O que fazer para contrariar esta tendência? Está a referir um problema comum a todo o interior do país. O enoturismo em particular ou mesmo o turismo em geral pode dar um contributo importante. O aumento de equipamentos de grande qualidade dispersos pelo território é um primeiro contributo visível. Teremos, contudo, de encontrar um modelo que fixe um maior quinhão da mais-valia na própria região. O turismo fluvial só não dá esse contributo. Qual o balanço que faz destes 15 anos do ADV enquanto Património Mundial? Acrescentaria só que acho que valeu a pena. Muito de reforço institucional que se tem verificado, estou a pensar o Museu do Douro, na Estrutura de Missão, etc. são respostas às novas exigências da região. Interessante seria recolher a opinião dos Duriense para a divulgar a refletir em conjunto sobre o que se poderia fazer melhor. Foram eles e são os atores mais importantes deste património de excelência – mesmo sem o saberem - e que ano após ano continuam a produzir um dos mais famosos vinhos do mundo, com o seu muito trabalho duro e suado… O que espera para o Douro nos próximos anos? Vou responder de forma provocatória. O que espero sinceramente para o Douro nos próximos anos é uma atitude concertada e mesmo mais arrojada dos seus autarcas e responsáveis com funções institucionais. Menos individualismo do que tem acontecido até à data. As exceções são ainda muito poucas…

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