Destaque Reportagem

Douro unido em movimento de apoio à Ucrânia

24 de fevereiro de 2022 ficará para sempre registado como o dia em que a guerra regressou ao território europeu. Vladimir Putin deu a ordem e as tropas russas iniciaram, nessa madrugada, uma ofensiva contra a Ucrânia que terá morto já mais de 800 civis e provocado cerca de 3,5 milhões de refugiados e mais de 6 milhões de deslocados internos.

[caption id="attachment_28110" align="alignleft" width="642"] Foto: David Araújo | Kiev[/caption]

Com as imagens de destruição e sofrimento humano que nos chegavam pela televisão, cresceu também, em toda a Europa, um espírito solidário que se materializou num apoio sem precedentes, a todo o povo ucraniano.

Recolhas de alimentos, roupas e medicamentos, concertos solidários, vigílias, iluminações de fachadas de edifícios icónicos, posições públicas de personalidades relevantes de diversos setores da nossa vida, foram várias as formas que surgiram para apoiar o povo ucraniano, de diferentes dimensões e partindo não só das entidades públicas mas muitas também da iniciativa privada e associativa.

Douro envia 170 toneladas de apoio e disponibiliza-se a receber 400 refugiados

No Douro, das muitas iniciativas que têm sido levadas a cabo o destaque vai para o movimento “Somos Ucrânia”, organizado pela CIM Douro, e que no total levou até à zona de conflito, 170 toneladas de alimentos, roupa e medicamentos. Entre os 19 municípios foram ainda disponibilizadas as condições para receber cerca de 400 refugiados.

Para o presidente da CIM Douro, este momento é um teste à união do território que, com a resposta que está a dar, mostra o seu lado mais solidário e humano perante as atrocidades da guerra.

[caption id="attachment_28112" align="alignright" width="642"]Douro unido em movimento de apoio à Ucrânia Foto: Gavinha[/caption]

“Esta questão humanitária foi mais um teste à nossa capacidade de união, num tema que é novo para todos nós, esta invasão, esta tragédia.

Percebemos que o povo do Douro é um povo solidário, percebemos que havia uma ou outra ação espontânea no território e fizemos uma reunião de urgência, para não só estarmos disponíveis, mas para enquadrarmos todas as ações espontâneas que estavam a acontecer. Enquadramos todas num projeto único do Douro, dando-lhe a dimensão que devia ter.

Fizemos um levantamento junto de todos os municípios e temos condições para alojar até 400 pessoas na região do Douro. Quando digo alojar é em condições de grande dignidade, porque nós percebemos que as famílias que estão a vir são famílias que vêm de um país organizado, de um país livre, com dinâmica económica. Há famílias que têm um estrato social elevado, e nós temos de os saber receber com dignidade, embora que seja de forma provisória, mas tem de ter dignidade.

Estamos a atingir os nossos objetivos nesta missão, não gostávamos de nos unir para estas coisas, gostávamos de nos unir para outro tipo de atividades, mas tendo em conta o espírito solidário que o interior do país tem, porque sabe fazer, sabe estar, sabe receber, nada melhor que estarmos a ajudar este povo que é um povo irmão da liberdade”.

O Presidente da Comunidade Intermunicipal admite que é difícil prever quando chegará o fim deste conflito mas deixa a garantia de manter o apoio ao povo ucraniano sempre que necessário.

“Não sabemos o que vem pela frente, não entendemos esta atitude de alguém que é psicopata e não percebemos muito bem até onde pode ir. Enquanto não tivermos o povo da Ucrânia, novamente feliz, nós estaremos sempre disponíveis, dentro dos possíveis, para ajudar aquele povo a encontrar alguma felicidade. A palavra felicidade não é a mais correta, mas encontrar ali algum conforto. Enquanto não sentirmos que o povo ucraniano está, minimamente, confortável, acho que nenhum português pode dizer que o objetivo está cumprido”.

[caption id="attachment_28111" align="alignleft" width="642"] Foto: David Araújo | Kiev[/caption]

Juntando a sua voz aos muitos que se levantam contra esta guerra, Carlos Silva admite que gostaria de ver a NATO fazer mais pela Ucrânia, não acreditando que o conflito se pudesse espalhar pela Europa.

Acredito que tenha que haver diplomacia, mas quando estamos a tratar com um psicopata, quando estamos a tratar com alguém que sabe que se destroem maternidades, que se matam crianças e depois ainda faz propaganda a dizer que são vídeos da própria Ucrânia para cá para fora, quando são os próprios russos já a identificar isso, acho que vai para além dos limites.

Vladimir Putin tem a perfeita noção da força do mundo. Uma coisa é o David contra Golias, nesta fase, outra coisa a Rússia contra o mundo. Não acredito que isso venha a acontecer, acredito sim que nós na Europa estamos muito agarrados ao glamour e ao show off, não estamos preparados para dar uma resposta europeia neste tipo de circunstâncias.

A Europa e os Estados Unidos já podiam ter feito muito mais do que fizeram. É muito mau que não se consiga ter uma resposta nestas circunstâncias”.

Refugiados já chegaram ao Douro

Ao todo a CIM Douro proporcionou já transporte a cerca de 100 pessoas que chegaram a território nacional.

Na chegada foram encaminhados para Sernancelhe onde foram recebidos com uma refeição quente e alojamento.

O presidente da CIM Douro e autarca sernancelhense foi uma das caras que recebeu este grupo, “quando saíram do autocarro foi, acima de tudo, um alívio, a exaustão era tanta que nem se conseguia ver a tristeza nos olhares”.

Da quase centena de refugiados recebidos no Douro, parte tem-se deslocados para outras regiões ao encontro de familiares e amigos já estabelecidos no nosso país. De acordo com dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, enviados à agência Lusa, antes da invasão da Rússia, viviam em Portugal 27.200 ucranianos. Desde o início da guerra, 18.400 cidadãos oriundos da Ucrânia pediram proteção temporária a Portugal.

Entre os que ficaram no Douro estão Viktoriia, Roma e Dmytro, mãe e dois filhos com 8 e 15 anos respetivamente, vindos de Myrhorod, cidade do centro da Ucrânia com uma economia muito suportada pelo turismo.

[caption id="attachment_28108" align="alignright" width="642"] Foto: VivaDouro[/caption]

Em tarouca, onde estão já há uma semana, esta família recebeu a nossa reportagem com um sorriso no olhar.

Viktoriia e o marido eram proprietários de duas joalharias, negócio a que se dedicaram depois do marido decidir deixar o emprego de mestre joalheiro numa fábrica.

Dmytro é o nosso interlocutor, fala inglês fluente e vai ajudando a mãe na tradução sempre que pedimos para ouvir a sua opinião.

O jovem, de apensa 15 anos, que sonha ser programador informático diz-se tranquilo agora que está em segurança mas a presença do pai na Ucrânia é algo que o preocupa, “falamos com ele várias vezes mas nunca se sabe o que pode acontecer no minuto seguinte. A situação na Ucrânia está muito perigosa neste momento”.

Quando saíram da cidade Natal, o rumo da família foi Lviv, cidade onde, após uma noite num Centro de Refugiados se instalaram em casa de amigos durante cerca de uma semana até conseguirem apanhar um dos comboios que os transportou até à Polónia. Já dentro das fronteiras da União Europeia foram recebidos por uma família polaca “que ajudou com os contactos com a Embaixada de Portugal”, até entrarem no autocarro que os trouxe numa viagem de mais de 40 horas até Sernancelhe. Um dia após a chegada chegaram a Tarouca, cidade onde se instalaram.

Para Viktoriia agora é tempo de respirar alguma tranquilidade, apesar disso não esconde a preocupação com o marido.

“Agora estou mais descansada porque sinto que os meus filhos estão em segurança mas estou ainda muito preocupada com o meu marido que teve que ficar lá”.

[caption id="attachment_28113" align="alignleft" width="642"] Foto: David Araújo | Kiev[/caption]

Mas não é apenas o marido de Viktoriia que está no pensamento desta família. Dmytro conta-nos que o tio “esteve 15 dias num abrigo em Mariupol, já não tinham água, nem comida nem eletricidade, mas não podiam sair porque podiam ser atingidos pelos bombardeamentos constantes”. Depois de estabelecidos os corredores verdes, para que os civis pudessem fugir das zonas mais afetadas, o irmão de Viktoriia foi para Zoporija, uma viagem atribulada com “diversos carros e autocarros cheios de civis a serem atingidos por disparos do lado russo”.

Ao recordar os momentos que passou, a voz de Dmytro fica mais pesada e, sem nunca referir o nome de Vladimir Putin, afirma que a Rússia é neste momento um estado terrorista.

Dizem que Al-Qaeda é um grupo terrorista porque atirou os aviões contra as torres gémeas em Nova Iorque e matou muitas pessoas. Aquilo que a Rússia está a fazer também é terrorismo, também está a matar pessoas inocentes. A Rússia é um país terrorista. Porque é que ninguém diz isso? Eles estão a dizimar as nossas cidades, não deixam nada de pé. Duas ou três horas antes de estarmos aqui a falar um Centro Comercial em Kiev, onde eu costumava ir, foi atingido por um rocket. Ninguém está seguro em nenhum local”.

Uma semana em Tarouca

“Aqui, em Tarouca, consigo encontrar tudo o que preciso, sinto-me bem aqui. Na Ucrânia tocava guitarra baixo e bateria, aqui tenho uma escola de música onde posso praticar. Também tenho o skate parque para andar de skate que também era algo que fazia em casa”, conta Dmytro que diz ainda que a mãe “tem muita vontade de voltar a trabalhar, seja no que for”.

Por agora é tempo de habituação a uma realidade diferente da que viviam, um processo que tem provocado alguns percalços, encarados com boa disposição.

“Ainda nos estamos a habituar a todas as diferenças, por exemplo, vocês aqui fecham tudo na hora de almoço, na Ucrânia as coisas abrem às 9 e fecham às 18, não fechamos a porta a meio do dia para almoçar (risos).

No domingo saímos para dar um passeio e começamos a ver que tudo estava fechado, depois explicaram-nos que era domingo e as lojas não abrem (risos), nós estamos habituados a ter tudo aberto, todos os dias (risos), tem alguma piada estarmos ainda a aprender estas coisas, com o tempo já vai ser mais fácil.

Na alimentação também há muitas diferenças, vocês comem imenso, cada refeição tem sopa, prato principal, com muita comida, a sobremesa e o café… para nós é impossível fisicamente comer tanto… (risos)”.

Apesar dos percalços a família diz-se grata por todo o apoio que tem recebido e que tem visto para com o seu povo.

“É bom sentir que somos bem recebidos. Sentimos que as pessoas percebem que estamos a fugir do nosso país porque não estamos seguros, e todos nos recebem de braços abertos.

Quero agradecer, do fundo do coração tudo aquilo que estão a fazer por nós, acho que o posso dizer em nome de todos os refugiados, muito obrigado pelo apoio que nos dão”.

Para a vereadora do município de Tarouca, responsável pelo pelouro a Ação Social, Susana Gouveia, a chegada e integração desta família “está a decorrer de forma discreta e tranquila”.

A autarca reconhece que a situação, sendo nova, não é fácil para ninguém, e destaca o lado humanitário das gentes durienses em toda esta iniciativa conjunta dos municípios da CIM Douro.

“Como qualquer outro município estamos abertos a receber estas pessoas que estão a ser atingidas pelo flagelo da guerra, não podemos ficar indiferentes.

Num espírito de humanidade e humanitário, estamos a criar condições para receber estes cidadãos e transmitir-lhes alguma paz, que é o que mais precisam neste momento, bem como o conforto habitacional.

Não tem sido fácil porque é algo novo mas, é também um desafio que recebemos enquanto cidadãos e autarcas responsáveis pelos destinos do concelho. Foi por isso que decidimos juntar os 19 concelhos da CIM Douro, para criar todas as condições para recebermos quem chega fragilizado”.

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